A discussão sobre a nomenclatura de alimentos veganos e vegetarianos vem da Europa. Mas a polêmica dá muito o que pensar no mundo todo. Tanto que o debate começou no Reino Unido e pode determinar os rumos da rotulagem em toda União Europeia. Representantes de entidades de classe de produtores de carne têm alegado que imitações de carne não podem ser chamadas de “carne vegana”, “salsicha vegetariana” e outras denominações parecidas. Já quem produz os substitutos para carne tem uma posição oposta. Alguns vegetarianos e veganos também discordam dos produtores de carne.
A discussão foi parar no Parlamento Europeu. Não vai afetar quem produz carne ou imitações para o mercado brasileiro. No entanto, tem impacto para quem exporta esses produtos. Além disso, é necessário entender o que há por trás dessas discussões para se preparar para as mudanças.
Alteração 41: entenda o caso “carne vegana”
A polêmica da imitação de carne começou quando o Comitê de Agricultura do Parlamento Europeu levantou o assunto. A proposta faria parte de um projeto de lei maior que será votado em setembro de 2019.
David Lindars, diretor de operações técnicas da Associação Britânica de Processadores de Carnes (BPMA, por sua sigla em inglês) afirma que a intenção é ser claro com o consumidor. A Alteração 41 tem chances de ser aprovada, pois há precedentes. Isso porque em 2017 o leite de soja teve que se transformar em bebida de soja no bloco europeu. Alguns deputados da UE, segundo a BBC, já se manifestaram a favor da mudança. Dizem que a alteração de como a carne vegetariana é chamada é uma questão de bom senso.
No entanto, muita gente afirma que o real objetivo da proposta é proteger os produtores de carne. A própria Vegan Society afirma que tirar o termo carne das imitações é ruim para quem não come o alimento. “Isso teria um impacto sobre a capacidade dos veganos de escolher alimentos de acordo com suas crenças facilmente”, disse Mark Banahan à BBC, diretor de campanhas e política da organização.Para ele, o termo carne diz muito sobre a forma de preparo e sabor também.
Como seriam chamadas as imitações de carne se o projeto for aprovado?
Os nomes adequados para imitações de carne seriam “tubos de vegetais” ou “discos de vegetais”, de acordo com David Lindars. Segundo ele, os produtores de alimentos com carne vão gostar. O motivo seria que não resta nenhuma dúvida de que trata-se do que é carne de original animal e o que não é.
Os produtores dos “substitutos de carne” têm reclamado da Alteração 41. Do ponto de vista do marketing, os nomes não favoreceriam, de acordo com eles, a venda dos substitutos de carne.
Se a medida passar pelo Parlamento Europeu, a mudança do nome traz enormes consequências. Os departamentos publicitários terão que repensar o marketing. Além disso, todos os rótulos serão obrigados a passar por reformulações.
E embalagem é bastante relevante. Uma pesquisa do Ibope revelou que 55% dos brasileiros consumiriam mais produtos veganos se a informação viesse na embalagem com mais clareza. Nas capitais, a tendência é bem mais forte, 65% diz que compraria um produto sem carne ou qualquer outro ingrediente de origem animal.
Empresas de carne vegetal movimentam milhões
Segundo análises da Grand View Research, os substitutos de carne movimentarão US$ 5,8 bilhões em 2022. Startups que investem na carne feita com ingredientes vegetais já se destacam até mesmo na bolsa de valores. Um exemplo é a americana Beyond Meet. A startup entrou em Wall Street em abril de 2019 e em pouco tempo, em maio, foi avaliada em US$ 1,5 bilhão.
Outro caso de sucesso na indústria alimentícia é o da Impossible Foods. Localizada no Vale do Silício, a empresa arrecadou US$ 750 milhões de investidores. A produtora de “carne veg” conquistou celebridades como Serena Williams, Katy Perry e Jay-Z. A Burger King também resolveu vender o hambúrguer da Impossible em caráter experimental porque o sabor do hambúrguer é bastante parecido com o da carne tradicional.
Milionários como Bill Gates e Leonardo DiCaprio também investiram em empresas que oferecem carnes alternativas.
A pergunta que fica é: Será que se o termo carne vegetal, vegetariana ou vegana não pudesse ser usado, atrairia tanta atenção?
Fato é que o consumo da carne de origem animal tem caído em países como Estados Unidos e Reino Unido enquanto o consumo das alternativas vegetarianas e veganas têm crescido. Nos EUA, produtos sem carne tiveram um crescimento de 42% entre 2016 e 2019. US$ 900 milhões foi o valor movimentado neste período, segundo a consultoria Nielsen. No mesmo intervalo de tempo, a carne tradicional teve um aumento de 1% apenas.
Como mostramos em um outro artigo, uma alimentação com menos carne é uma tendência que veio para ficar. No Reino Unido, berço da discussão, o consumo da carne caiu 2%. Já os produtos que substituem a carne tiveram alta de 18% só em 2019.
A proposta da União Europeia pode se tornar lei em setembro. O que você acha? Prefere um nome que soa melhor ou um que é bem claro para o consumidor? A discussão dá pano para manga e nós, da indústria de alimentos, devemos ficar atentos!